![as_fases_dos_ensaios_clinicos.png as_fases_dos_ensaios_clinicos.png]()
Este será o primeiro post de vários sobre ensaios clínicos. Muitas vezes lemos notícias com títulos que aguçam a curiosidade e fomentam a esperança, ou somos abordados sobre a possível participação num estudo médico e convém por isso perceber um bocadinho mais como é que isto funciona, que legislação existe em Portugal e o que o doente pode esperar nestas situações.
Assim, comecemos por perceber um bocadinho melhor as diferentes fases dos ensaios clínicos. Creio que a imagem que ilustra este post fala por si, não obstante, eis a explicação.
Como se chega a um novo medicamento?
O plano de desenvolvimento de um medicamento implica uma etapa de investigação pré-clínica e uma etapa de ensaios clínicos. Esta última é iniciada com a avaliação do perfil de segurança em indivíduos saudáveis (fase I); continua com a avaliação da eficácia e segurança a curto prazo e estabelecimento da dose (fase II); posteriormente passa a ser utilizada numa população mais alargada utilizando um comparador (fase III); e continua a ser estudado o seu perfil de segurança após a sua comercialização (fase IV).
Um ensaio clínico é liderado por um Investigador Principal (médico), contudo é executado por uma equipa de investigação multidisciplinar que pode incluir médicos, enfermeiros, farmacêuticos, técnicos de saúde, administrativos, etc. Os ensaios clínicos são promovidos por empresas farmacêuticas, grupos académicos, agências governamentais ou outras organizações
A implementação de um ensaio clínico implica a avaliação de centros de investigação e a formação de uma equipa de profissionais de saúde que irá incluir os participantes e segui-los no âmbito de um protocolo de investigação clínica autorizado previamente pela comissão de ética e autoridades regulamentares.
A participação num ensaio clínico permite ao doente ter um papel ativo na gestão da doença, contribuindo assim para o progresso da sociedade e do conhecimento científico.
Quais as fases do ensaio clínico?
A pesquisa clínica é usualmente classificada em 4 fases: I, II, III e IV. Devemos antes lembrar que, para se estudar clinicamente um medicamento, ele já deverá ter sido aprovado em testes pré-clínicos, ou seja, aspectos de segurança são avaliados em animais de experimentação antes da aplicação dessa droga em seres humanos. Quando essa medicação está pronta para ser testada no ser humano, as fases de investigação clínica iniciam-se e seguem uma após a outra, até que o maior volume possível de informações sobre o medicamento seja obtido. (Convém frisar que o sucesso de uma experimentação em labotatório ou em animais, não significa que seja bem sucedida em humanos. E é aqui que muitas das notícias que vamos lendo com títulos bem sugestivos pecam: extrapolam sucessos em animais para humanos).
Considerando os aspectos mais importantes e seus principais objetivos, cada fase de uma pesquisa clínica está resumida abaixo:
- Fase I: refere-se ao uso do medicamento pela primeira vez em um ser humano, geralmente um indivíduo saudável e que não tem a doença para a qual o medicamento está sendo estudado. Nesta fase serão avaliadas diferentes vias de administração e diferentes doses, realizando-se testes iniciais de segurança e de interação com outras drogas ou álcool. Cerca de 20 a 100 indivíduos participam dessa fase.
- Fase II: cerca de 100 a 300 indivíduos que têm a doença ou condição para a qual o procedimento está sendo estudado participam desta fase, que tem como objetivo obter mais dados de segurança e começar a avaliar a eficácia do novo medicamento ou procedimento. Os testes de fase II, geralmente diferentes dosagens assim como diferentes indicações do novo medicamento também são avaliadas nesta fase.
- Fase III: depois de concluído o estudo piloto, grandes estudos multicêntricos acompanham milhares de pacientes, 5 a 10 mil, em geral, dependendo da patologia em questão com a doença em questão, por um período maior de tempo, geralmente sendo comparados a outros tratamentos existentes e recomendados para o mesmo problema. Durante esta fase se espera obter maiores informações sobre segurança, eficácia e interação de drogas. Ao participar de uma pesquisa em fase III, o voluntário poderá receber ou o novo tratamento ou o tratamento habitual (ou placebo). Recebendo o tratamento habitual, o paciente será tratado com a qual os especialistas avaliam como o melhor tratamento da atualidade. Se o paciente receber o novo tratamento, será tratado com uma alternativa de tratamento que os especialistas esperam obter vantagens significativas sobre o habitual. O objetivo desta fase de estudo é comparar ambos os tratamentos e estabelecer a superioridade de um sobre o outro. Os testes de fase III devem fornecer todas as informações necessárias para a elaboração do rótulo e da bula do medicamento. A análise dos dados obtidos na fase III pode levar ao registro e aprovação para uso comercial do novo medicamento ou procedimento, pelas autoridades sanitárias.
- Fase IV: após um medicamento ou procedimento diagnóstico ou terapêutico ser aprovado e levado ao mercado, testes de acompanhamento de seu uso são elaborados e implementados em milhares de pessoas, possibilitando o conhecimento de detalhes adicionais sobre a segurança e a eficácia do produto. Um dos objetivos importantes dos estudos fase IV é detectar e definir efeitos colaterais previamente desconhecidos ou incompletamente qualificados, assim como os fatores de risco relacionados. Esta fase é conhecida como Farmacovigilância.
Quanto tempo dura cada fase do ensaio clínico?
Os estudos de fase 1 geralmente duram vários meses, mas menos de um ano. Como esses testes testam os tratamentos quanto à segurança, não à eficácia, eles só podem inscrever voluntários saudáveis.
Cerca de 70% dos novos medicamentos em potencial passam na Fase 1 e entram na Fase 2, que continua a medir a segurança, enquanto observa a eficácia do tratamento. Os estudos de fase 2 recrutam até centenas de pacientes com a condição de participar. Essa fase geralmente dura vários meses a dois anos
Apenas 33% dos medicamentos passam da Fase 2 para a Fase 3, que testa o potencial tratamento no maior número de pessoas. Esta fase mede a segurança e a eficácia com muitos voluntários, às vezes milhares. Os ensaios da fase 3 duram de um a três anos.
Após a Fase 3, uma empresa farmacêutica pode se submeter às autoridades compenentes (mudam de país para país e na Europa ainda acresce a Agência Europeia do Medicamento) a documentação relativa ao tratamento para aprovação. As autoridades competentes (em Portugal o Infarmed e a nível europeu a Agência Europeia do Medicamento) analisam os resultados de todas as etapas do ensaio clínico para determinar se aprovará o medicamento e permitirá que a empresa farmacêutica comece a comercializá-lo para o público.
Após a aprovação, um tratamento pode entrar na Fase 4, também conhecida como teste pós-comercialização. Os pacientes são monitorados quanto aos efeitos colaterais de longo prazo do tratamento, que vão além do período das outras fases.
Como saber os ensaios clínicos que estão a decorrer?
Note-se que muitos estudos decorrem a nível internacional, uma vez que envolve equipas de vários países (sobretudo na área das Doenças Inflamatórias do Intestino). Existem duas bases de dados onde se podem ver os ensaios clínicos a decorrer a nível internacional:
Para a bases de dados de ensaios clínicos a decorrer em Portugal: https://www.rnec.pt/
Próximo post neste tema: Participação de Doentes em Ensaios Clínicos.