Um euro e dez
"Esta tarde, no bar do Apolo 70, chegou-se ao balcão, tímido, um preto de meia idade. Mãos encortiçadas - talvez trabalhador da construção civil. Perguntou à empregada se havia sopa. Sim, havia - se não entendi mal, de cozido e também de legumes. O homem, com olhar ainda amedrontado, perguntou quanto era. (Arrebitei as orelhas.) Um euro e dez. Está bem, num sorriso que lhe escapou - escolheu a de legumes. Diante do meu lanche de vários euros, senti-me comovido - ao lembrar-me que, àquela mesma hora, algures, Américo Amorim, branco como eu, trabalhador, "simples assalariado", estaria também inquirindo a medo o preço de uma sopa, sopesando a leveza de cortiça dos cobres que tem no bolso."